Exposição temporária ocorrida de 10/06 até 21/11/2019 no MAFRO.
Alimentar a cabeça : O Ritual do Bori
O trabalho é compreendido como um ritual poeticamente inspirado na prática de ofertar comidas para a cabeça em cerimônias religiosas de matriz afro-brasileira. Bori: da fusão bó, que em ioruba significa oferenda, com ori, que quer dizer cabeça, literalmente traduzido significa “Oferenda à Cabeça”. A ação consiste em oferecer comidas sacrificais a cabeça de doze performance, sendo estes representações vocativas e iconográficas dos doze principais orixás do candomblé. Dar comida para a cabeça é nutrir a nossa alma. Alimentar a cabeça com comidas para os deuses é evocar proteção. Todos os elementos que constituem a oferenda à cabeça exprimem desejos comuns a todas as pessoas: paz, tranqüilidade, saúde, prosperidade, riqueza, boa sorte, amor, longevidade. Cada pessoa, antes de nascer escolhe o seu ori, o seu princípio individual, a sua cabeça. Ele revela que cada ser humano é único, tendo escolhido suas próprias potencialidades. Odu é o caminho pelo qual se chega à plena realização de orí, portanto não se pode cobiçar as conquistas do outro. Cada um, como ensina Orunmilá – Ifá deve ser grande em seu próprio caminho, pois, embora se escolha o ori antes de nascer na Terra, os caminhos vão sendo traçados ao longo da vida.
Vídeo / Performance – Sacudimentos
Em abril de 2015, Ayrson Heráclito vestiu-se de branco para entrar na Casa da Torre de Garcia D’Ávila, construção de 1550, em Mata de São João, Bahia, sede do que foi o maior latifúndio da história do Brasil, que se estendia da Praia do Forte até o Maranhão. Pisava em terreno que fora o arcabouço da aristocracia baiana e a gênese da sociedade escravocrata brasileira. Portava galhos e folhagens de para-raios, romãzeira, aroeira, espada-de-são-jorge e outras plantas mágicas, a fim de realizar a primeira parte da performance O Sacudimento. Realizado por iniciados no candomblé jejê, como ritual de cura e limpeza de ambientes domésticos, o “sacudimento” ganha uma dimensão universal na obra de Heráclito. Segundo o artista, a energia quente desprendida das folhas batidas nos cantos da casa-forte de Garcia D’Ávila não era destinada a expulsar os frios “eguns” – espíritos que permanecem entre os vivos, trazendo-lhes infortúnios – de escravos vítimas de torturas e abusos extremos. Heráclito sacudia um único egum que assombraria o local: o senhor de escravos – e a violência infiltrada por ele sobre o antigo sistema social da Bahia e irradiada até os dias de hoje, na pobreza e na desigualdade social distribuídas por todo o País. “Trata-se de um ritual de ativação e apaziguamento de nosso passado colonial”, diz Ayrson Heraclito.